Tive uma semana daquelas. Daquelas que vão arruinando o bom humor pouco a pouco, através de um encadeamento interminável de chateações.
Nada muito errado aconteceu, mas vocês sabem como é isso: reclamação no trabalho, reuniões chatas que terminaram sem definição, discussõezinhas em casa com o marido e com as crianças, a gasolina acabando e você atrasada, o cartão bloqueado sem mais nem por quê, o uniforme de educação física que tinha que estar na mochila e está molhado lavando.
Enfim, um fenômeno que meu pai chamava de “a avalanche das misérias cotidianas“. De tirar o humor e a paciência de um monge.
E, sem paciência e de mau humor, aqueles problemas do trabalho pioram, as discussõezinhas viram discussões mesmo. Não adianta analisar o que levou a que, se o problema ao mau-humor ou vice-versa, já que nessa hora o que conta mesmo é o estado péssimo geral das coisas.
Para tentar sair dessa, aciono o seguinte mecanismo de defesa:
1- começo a elaborar pensamentos vagos, pura fuga assumida, sobre o quanto certas coisas no fundo pouco importam, que meu verdadeiro interesse pela vida não está em nada disso, que sempre se pode mudar tudo e recomeçar de outro jeito, que se reinventar é até divertido já que desse mundo nada se leva.
2- me fixo em uma lista-conforto: comida-conforto, memórias-conforto, livros-conforto, música-conforto, roupas-conforto.
E é só aí que a coisa começa a clarear. Quando paro tudo para que esses dois fenômenos simultâneos entrem em ação.
Duas receitas-conforto infalíveis, garantia de sorriso no rosto e relax na alma:
– macarrão cabelinho de anjo bem quentinho, com um pelote de manteiga ao centro, que vai derretendo devagar, mesclando na massa, onde finalizo com um punhado de parmesão. Pra comer numa cumbuca, no colo. Nada mais.
– Copo de leite bem frio, com biscoito de coco quentinho. Pra que o biscoito seja perfeito, melhor preparar em casa ou comprar na padaria e dar uma aquecida no forno antes de comer.
Livros-conforto pra mim são aqueles que me transportam à adolescência, em longas férias na praia, fazendo nada. Tipicamente todos os da Agatha Christie. Nada melhor que me aconchegar na poltrona e me dedicar a um bom mistério inglês, através das mentes engenhosas de Hercule Poirot ou Miss Marple.
Pra se deixar levar, nada de esforço. Entretenimento puro e simples.
E, por fim, as roupas-conforto são aquelas de malha mescla cinza, um xale de lã fininha e, no meu caso, Havaianas nos pés. As legítimas. Mas se a carência e auto-piedade forem mesmo muito graves, coloco meias grossas, daquelas caneladas fofas, pra andar escorregando pelo chão.
Me cuido assim, como a um convalescente de doença séria, o que me faz um bem enorme. Sigo então, renovada e relaxada, pronta pra outra.
Sempre há que se ter tempo para as curas da alma porque, afinal, do mundo nada se leva. Apenas ela, a alma, e, se tudo deu certo, uma alma-conforto!